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Diabetes 15 Anos

Hoje o post não vai ter dica de viagem. Mas tem um significado muito importante pra mim, e acho que pode ser útil em algo pra você também, que tem diabetes ou alguém importante pra você que tenha.

O ano era 2008, e eu apenas uma jovem imersa em uma nova vida adulta, aos 19 anos. Recém aprovada na faculdade, aprovada também em um concurso público que seria meu primeiro trabalho, e muitas responsabilidades – que surgiram de repente e ao mesmo momento. Ah, uma jovem também cheia de sonhos e super  empolgada com tudo que essa nova vida trazia de novidade!

O mês era setembro, e me lembro muito bem da última noite em que comi um pedaço de bolo do aniversário do meu pai. Último em que não me preocupei com contagem de carboidratos versus unidades de insulina e monitoramento. Essa era a noite que antecedia meu exame de sangue que traria o diagnóstico.

Mas vamos voltar brevemente aos fatos que antecederam o motivo para a realização desse exame de sangue.

Pré diagnóstico

Eu havia passado por uns dois episódios de uma forte tontura e leve confusão mental no trabalho, que acreditava terem sido pressão baixa (e eram provavelmente episódios de hipoglicemia). Mas nada que chamasse muito atenção, afinal pensava no calor, cansaço ou refeição em quantidade menor que o ideal.

Junto disso tinha perdido alguns quilos, mas sempre atribuindo tudo que sentia a correria repentina que tinha se instalado na minha vida! Fora isso, também tomava bastante água.  Mas ainda na insistência de não haver nada de errado, ou que merecesse investigação médica.

Certo dia, me vi com a visão embaçada ao tentar ler o letreiro de um ônibus no retorno pra casa, e nesse dia precisei perguntar a outra pessoa o que estava escrito. Isso sim me incomodou, lógico, precisava de óculos. Finalmente marquei um médico oftalmologista.

Após a consulta, o médico que me atendeu disse que eu parecia estar com um grau pequeno de miopia pelos testes que fizemos e me indicou providenciar  óculos. Junto disso, ele recomendou um exame de sangue, já que eu evitava há tempo pelo pavor de agulhas.

Pra mim, só mais um exame de rotina, e apesar da total aversão, fui fazer o exame, na noite após o aniversário do meu pai – aquela em que comi meu último bolo sem preocupações com a glicemia.

Alguns dias depois

Minha mãe recebeu uma ligação do laboratório pedindo pra que o exame fosse refeito – sem mencionar o que havia de errado. Preocupação instalada em casa, e nunca se quer considerávamos o diabetes, afinal, eu era magra, jovem e não tinha “cara” de quem poderia ter diabetes, jamais.

Exame refeito, e então confirmado: glicose alta.  No primeiro resultado algo próximo de 200 na glicemia jejum, e na repetição um pouco acima disso. Nem precisaria dizer que não entendemos nada né? Estávamos em choque! Paralisadas! Eu e minha mãe, com quem tinha ido buscar o exame.

Para nossa infelicidade, corremos no pronto atendimento (o laboratório ficava em um hospital) pra levar o resultado do exame e entender alguma coisa do que estava acontecendo. Pior recepção impossível! Só consigo me lembrar das instruções principais: diabetes, pro resto da vida, aplicar insulina todos os dias e várias vezes, e não pode comer mais nada.

O início

Uma bomba jogada em cima de mim! Saindo dali só conseguia chorar, era tanto que mal enxergava o caminho que segui pela rua. Eu e minha mãe estávamos em pânico! Por que eu? Logo eu, que adorava um docinho e com pavor imenso de agulhas?

O choro seguiu tarde e noite, a sensação era de ter recebido uma sentença de morte. Não fazia ideia do que me esperava, mas pelo que ouvi no atendimento médico me dava uma breve ideia de que não seria fácil. Simplesmente não conseguia pensar nos dias após aquela notícia.

Pra somar aos péssimos atendimentos (por favor profissionais de saúde, tenham empatia com as pessoas recém diagnosticadas!), encontrei nesse caminho uma médica igualmente fria, que me deu as informações da pior forma possível.

Pra início de conversa, uma lista de compras a serem feitas com urgência: seringas (muitas delas), glicosímetro, fitas de glicemia e insulinas. A pior compra que fiz na minha vida! E que só foi possível, na época, com a ajuda de amigos do trabalho – sim, além do abalo psicológico, vem um grande custo financeiro!

Nada fazia sentido, e eu buscava explicações pra aquela situação – as mais improváveis possíveis. Será que a glicose subiu no exame porque eu tenho medo e fico nervosa? Alguma coisa específica que eu comi? Será que o hidratante de morango que eu uso na pele tá passando açúcar pra corrente sanguínea? Louco né, mas tudo que a gente precisa nesse momento é algo que justifique que aquilo vai passar.

Eu simplesmente não conhecia ninguém que tivesse diabetes tão jovem como eu, aquilo devia estar errado, e só passava pela minha cabeça negação! Mas o glicosímetro me mostrava que algo precisava ser feito.

Diabetes tipo 1 e a rotina de aplicações de insulinaComeçamos com o uso da insulina…

Primeira aplicação foi difícil demais! Escolhi a região da barriga pra iniciar, e as lágrimas escorriam no meu rosto, dificultando que eu enxergasse a seringa pra aplicar a dose. Comecei usando NPH, duas vezes ao dia – horários fixos, sendo que a aplicação da noite era justamente no horário da faculdade, ou seja, eu tinha que fazer isso sozinha.

Mais dolorido do que as injeções, eu achava os furinhos pra medir a glicemia. Logo me peguei pensando por quanto tempo eu aguentaria aquilo. Será que um ano? Não sei dizer ao certo como me sentia, mas era uma mistura de aflição com medo, e tudo parecia de cabeça pra baixo.

Não fiz acompanhamento psicológico à época (hoje não tenho dúvida do quanto teria me ajudado!), mas tive muito apoio de pessoas próximas a mim, além da minha família, que me acolheram e se dispuseram a me ajudar sem medida. Sou grata demais!

Logo procurei uma nutricionista, com quem me dei muito bem, e o susto do diagnóstico me deixou bem disciplinada com o plano alimentar, a ponto de eu não comer quando não encontrava o que estava programado no lanche da noite – o momento mais difícil do dia nesse quesito. Olhava lista de ingredientes, quantidade de carboidratos, e não falhava nas recomendações da nutri.

Seguindo firme

Nesse início não havia ainda liberdade na escolha dos alimentos e ajustes com uso de insulina rápida (usava doses fixas já programando o que comeria), mas foi suficiente pra junto da medicação eu retomar meu peso anterior, e a visão rapidamente voltou ao normal! Concluindo, não era necessidade de óculos, e sim um impacto da glicemia elevada.

Ah, e pra completar, não tenho outro diagnóstico de diabetes na família, e logo com a realização de exames complementares descobri hipotireoidismo (esse sim, tenho familiares). Até então jamais havia lido sobre doença autoimune, e o medo seguinte que se instalou? Quantas e quais dessas eu teria! Mas paramos por aí!

Fato é que a gente aguenta mais do que inicialmente pensa! E os dias foram passando, alguns mais felizes, outros mais tristes (confesso que por certas vezes não queria dormir, simplesmente por pensar que tudo teria que começar novamente).

Voltei em algumas consultas da médica que comentei, e quando reparei que por todas as vezes eu saía de lá chorando (geralmente eu e minha mãe), decidimos dar um basta e procurar por outro médico.

Nessa época conheci um médico do SUS que tinha diabetes tipo 1 há muitos anos, sem qualquer problema decorrente (o que muito me inspirou), e o sentimento em relação ao diabetes foi melhorando um pouco. Foi quando também passei a receber insulina,  glicosímetro e fitas de medição pela farmácia de alto custo do município, o que melhorou a parte financeira da doença.

Aos poucos fui aprendendo e ensinando pessoas ao meu redor, que passaram a me ajudar também com as aplicações de insulina, e tudo foi ficando um pouco mais leve.

Importante lembrar que eu ainda era aquela jovem de 19 anos né? 

As mudanças

A vida não poderia parar por aí! Continuei trabalhando, estudando bastante e vivendo as experiências de quem tem essa idade – mas agora junto do diabetes.

Com o decorrer do tempo foram acontecendo algumas mudanças no tratamento, experimentando outros médicos e outras combinações de insulina. Lembro de quando passei a usar insulina análoga de longa duração, e a aplicação única diária passou a ser suficiente, foi algo incrível no tratamento pra mim!

Mas com o avançar dos anos também fui ficando um pouco relaxada com o tratamento, medindo menos, às vezes pulava alguma aplicação de insulina, alimentação nem se fale.

Bom, no aspecto pessoal evolui bastante, e fui amadurecendo com tudo que tive que passar nesse período (que não foi só o diagnóstico da doença). Após quatro anos de diabetes, eu tinha me formado na faculdade, feito várias provas de concurso público, e passado em mais um, onde minha vida de fato começou a mudar.

Com quase um ano nessa nova carreira profissional, conheci meu marido. Fato é que ele me encontrou em um momento que relatei anteriormente, de desânimo com tudo que já vinha fazendo há exatos cinco anos, às vezes tendo sucesso, às vezes não.

Estava tão distante de tudo que deveria estar fazendo que ele nem desconfiou que eu era diabética! Também fiz questão de que isso não acontecesse, com medo talvez de assustá-lo, ou de que isso fosse nos afastar. Mas pra minha surpresa, quando ele descobriu me acolheu da melhor forma possível, e na verdade ficou bravo por eu não ter contado antes.

Sei que muita coisa mudou após essa “revelação”, afinal eu podia agora ser diabética! Ele passou a me cobrar cuidados sobre a doença, medição, e inclusive foi quem me fez conhecer o médico endocrinologista que me acompanha até hoje!

Diabetes tipo 1 e a dose diária de vida: insulina

A superação diária

Nesses 15 anos de diagnóstico tive sim vários momentos de cansaço da rotina tão exigente, desânimo com o tratamento, ou frustração por cometer erros. E isso é normal! Não precisamos ser fortes todos os dias e incansáveis na busca da perfeição, se hoje não está tudo bem, ok, amanhã vai estar.

Não seria hipócrita em dizer que hoje comemoro meus 15 anos com diabetes, afinal é uma doença crônica séria, que acomete milhões de pessoas, e que pode levar a graves complicações. Mas comemoro a minha superação diária e tudo que já venci até aqui, conseguindo hoje tratar disso com leveza e compartilhar minha experiência com você.

A grande conquista pra mim foi fazer o diabetes parte da minha rotina. Aplicar insulina hoje é um hábito como tomar banho. Com tantos recursos pra monitoramento (que infelizmente ainda é acessível a poucos), ganhei mais segurança e flexibilidade. Muitos avanços que hoje nos permitem viver com mais tranquilidade, pra nós e nossa família, e sem maiores limitações.

E informação (fontes confiáveis, como a SBD)! Ela sim nos permite compreender a doença e como facilitar essa relação. Nos mostra soluções, nos apresenta pessoas que passam pelas mesmas dificuldades que nós, e acima de tudo nos traz esperança! Se você acredita ou não na cura, dias melhoras nos esperam!

Assim como setembro se despede do inverno pra dar lugar à chegada da primavera, que traz de volta a vida na sua forma mais linda, assim vejo aquele setembro de 2008. Tive a oportunidade de renascer pra uma outra versão da minha vida sem maiores complicações, onde cada coisa foi tomando seu devido lugar. 

O diabetes hoje faz parte do meu propósito e me inspirou a criar esse espaço de compartilhamento! Se você quer compartilhar sua experiência, ou deixar comentário, será ótimo interagir com você!

Meu agradecimento especial, a todos que estão ao meu lado nessa doce vida diabética! 😉

Nós somos Camila e Rodrigo, um casal apaixonado por viagem e produtores do conteúdo da página. Juntos, amamos conhecer novos destinos e voltar já planejando o próximo roteiro.

9 Comentários

  • Riani

    Que linda história de vida!
    Incrível que mesmo próximas, eu não conhecia todos esses detalhes. Obrigada por compartilhar. É importante mesmo para quem não vive a doença para que tenhamos consciência e empatia.
    Te amo, amiga ❤️

  • Ingrid Vieira

    Não sou diabética, mas tenho um gatinho diabético. Apesar de ser só a tutora de um serzinho diabético, compartilho de vários sentimentos e desafios.
    O diagnóstico veio a 2 anos e desde então temos enfrentado algumas dificuldades, desde os desafios diários como alimentação adequada e aplicação de insulina, até restrições na rotina como não poder viajar já que não podemos levá-lo (fica muito stressado), nem deixá-lo no hotelzinho (ele não se alimenta) e, até o momento, não encontramos uma pessoa que possa cuidar dele em nossa casa.
    Me lembro de quando vc me contou (aniversário da Aline em BM): não entendi direito o tamanho da situação e meu pensamento foi: Como ela é diabética tão jovem e magra?
    Hoje entendo um pouco sua luta e já pude contar com seu conhecimento no assunto, ☺️.
    Amei poder conhecer mais sobre sua jornada e fiquei motivada a cuidar cada vez melhor de meu bichinho.

    • Insulina na mala

      Amiga, imagino suas dificuldades pensando ainda em um animal, que nem pode comunicar o que sente! Mas tenho certeza que com todo o seu amor e cuidado encontrarão a melhor forma de superar isso! Feliz em te ajudar um pouquinho que seja! E brigada pelo carinho! ❤️

  • Márcia

    Parabéns norinha! Vc é um exemplo de superação, linda sua história. Que seja insentivo a outra pessoas doces como vc! Hoje faço parte desse grupo. Orgulho de vc! Amo❤️

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